Compliance Anticorrupção para empresas: saiba como estruturar

Ana Catarina Alencar
Ana Catarina Alencar
Advogada | Especialista em Direito Digital e Compliance | Coordenadora da Revista Eletrônica da OAB/Joinville | Professora | Mestre em Filosofia e Teoria do Direito | Especialista em Inteligência Artificial e Direito

Introdução

Entenda a importância do Compliance Anticorrupção para a sua marca e confira nossas dicas sobre como redigir uma Política efetiva para os seus negócios.

Leia o artigo abaixo e tire suas dúvidas sobre o tema!

O que é Compliance?

O Departamento de Compliance é uma área de visão 360º sobre a empresa, envolvendo pessoas, cultura, processos, procedimentos e marcas. Logo, Compliance é um termo que aborda diversas temáticas, incluindo: relações com colaboradores, meio-ambiente e sustentabilidade, diversidade e inclusão, relações com fornecedores, combate à corrupção, à fraude, à lavagem de dinheiro, entre muitos outros.

O “Compliance Anticorrupção” é um dos temas mais conhecidos e importantes do Departamento de Compliance, sendo fundamental para a manutenção da reputação da empresa e atração de investimentos. Hoje, existe farta legislação prevendo sanções para atos de corrupção no Brasil e no exterior, bem como diversos casos já julgados, como os recentes escândalos de corrupção vistos em solo brasileiro, especialmente, no âmbito da Operação Lava-Jato.

Deste modo, a área de Compliance Anticorrupção tem se tornado cada vez mais relevante no cenário empresarial, evitando a aplicação de multas e sanções e atraindo a confiança de consumidores e parceiros comerciais no mercado. 

Por isso, neste artigo, abordaremos os principais aspectos de um bom Programa de Compliance Anticorrupção, incluindo as diretrizes principais de suas políticas. 

Programa de Compliance Anticorrupção 

Um bom Programa de Compliance Anticorrupção visa prevenir e combater atos de corrupção. Inicialmente, é necessário esclarecermos o significado dessa expressão. “Corrupção” significa prometer, oferecer, receber, pagar ou entregar qualquer coisa de valor a um Agente Público com o objetivo de conseguir uma vantagem indevida. 

Isso inclui, por exemplo, o caso de um colaborador que resolve pagar uma quantia em dinheiro para um funcionário público, com o objetivo de fazer com que sua empresa ganhe uma licitação. Importante observar que, neste contexto, um “Agente Público” é qualquer pessoa que represente órgãos governamentais, sejam eles municipais, estaduais ou federais, localizados no Brasil ou no exterior.  

Por isso, sempre que um colaborador da sua empresa interage com quaisquer pessoas que representam o governo, é necessário ter atenção total e evitar atos que impliquem em “corrupção”, ou seja, a promessa, oferecimento, pagamento ou entrega de coisa de valor para obter uma vantagem indevida com essa transação.

Em situações do dia a dia, o exemplo mais comum para identificarmos um ato de corrupção é o pagamento em dinheiro, também conhecido como “suborno”. Porém, existem muitas outras formas pelas quais um ato de corrupção pode se dar em uma empresa, incluindo os chamados “Pagamentos de Facilitação”. 

Os “Pagamentos de Facilitação” são valores solicitados por funcionários públicos no momento de liberar um documento ou uma licença com maior “agilidade” para a empresa. Essa prática corriqueira em muitas regiões do Brasil constitui um ato de corrupção. 

Além disso, é necessário destacar que o colaborador da empresa também pode ser punido, enquanto pessoa física, pelos atos de corrupção dos quais seja autor, co-autor ou partícipe, considerando que se trata de tipo penal. Isso quer dizer que, não apenas a pessoa jurídica e seus dirigentes podem ser responsabilizados, mas também os terceiros que estejam envolvidos na conduta em questão. 

Adicionalmente, existem outras situações e comportamentos que também implicam em atos de corrupção, ainda que não envolvam pagamentos, tais como: (i) dificultar investigações e fiscalizações de órgãos públicos na empresa; (ii) presentear Agentes Públicos ou pessoas próximas com bens e/ou itens de valor significativo; (iii) oferecer oportunidades de trabalho a pessoas relacionadas a Agentes Públicos; (iv) realizar doações para organizações ligadas a Agentes Públicos ou Pessoas Politicamente Expostas, entre outros. 

Política Anticorrupção

Considerando a natureza e os riscos dos atos de corrupção, a Política Anticorrupção de uma empresa deve conter algumas diretrizes principais, a fim de garantir sua efetividade, incluindo:

1) Interações com Agentes Públicos

Todas as interações da empresa com Agentes Públicos devem ser transparentes, legítimas e realizadas por colaboradores treinados. Isso implica em dizer que a comunicação dos colaboradores ao lidarem com esses Agentes deve ser clara e objetiva, sem deixar quaisquer margens para interpretações dúbias. Além disso, as interações de colaboradores com Agentes Públicos devem ser realizadas pelos canais oficiais da empresa, preferencialmente, dentro do horário comercial e com o envolvimento dos demais responsáveis pela tarefa. 

2) Relações com Agentes Públicos e Pessoas Politicamente Expostas

A fim de evitar favorecimentos e conflitos de interesses, os colaboradores da empresa devem informar suas relações de parentesco ou proximidade com Agentes Públicos ou Pessoas Politicamente Expostas. São consideradas Pessoas Politicamente Expostas aquelas que exercem ou exerceram, nos últimos cinco anos, no Brasil ou no exterior, algum cargo, emprego ou função pública relevante.

3) Brindes e Entretenimento para Agentes Públicos

A Política Anticorrupção deve contar com diretrizes claras sobre a aceitação e o oferecimento de brindes, viagens e vouchers de entretenimento para Agentes Públicos. Como boa prática de Compliance, é recomendável que qualquer brinde, despesa de viagem ou entretenimento seja expressamente proibida quando for oferecida ou recebida de Agentes Públicos. Isso porque, o oferecimento ou o recebimento de qualquer item, independente do seu valor, por Agente Público, sempre implica em um alerta de corrupção.

4) Brindes e Entretenimento para Parceiros da Iniciativa Privada 

No que tange à iniciativa privada, é possível dizer que o recebimento ou o oferecimento de brindes, viagens e entretenimento representa uma prática naturalizada no mundo dos negócios. Em situações festivas, por exemplo, é muito comum receber brindes promocionais de algum parceiro de negócio, contendo a marca da empresa e uma mensagem de agradecimento. 

Além dos aspectos culturais envolvidos nessa prática comercial, é importante ressaltar que no Brasil não há a tipificação de um crime de corrupção entre entes da iniciativa privada: o crime e as sanções eventualmente aplicáveis na esfera administrativa visam apenas entes privados que se relacionem com Agentes Públicos. Por isso, esses riscos são minorados quanto tratamos de brindes e entretenimento na iniciativa privada.  

Neste sentido, uma boa prática de Compliance é estabelecer na sua Política Anticorrupção, um valor limite para o recebimento de brindes de parceiros comerciais da iniciativa privada. Muitas Políticas preveem regras estipulando valores em torno de USD 50,00 (cinquenta dólares) para esse oferecimento ou recebimento. 

Brindes, despesas de viagens e/ou vouchers de entretenimento que excedam esse valor devem ser sempre reportados ao Compliance Officer da empresa. Nestes casos, poderão ser previstas regras de devolução do brinde para o parceiro comercial que o tenha oferecido, a realização de um sorteio entre colaboradores da própria empresa ou, a sua doação a uma instituição de caridade. 

Conflito de Interesses

Para prevenir atos de corrupção, é necessário que sua Política conte com uma seção sobre “Conflito de Interesses” ou, que uma Política à parte seja redigida sobre este tema. O “Conflito de Interesses” representa uma situação na qual o colaborador age em prol de interesses particulares, contrários aos objetivos da empresa ou, que possam causar danos à organização. 

Essas situações não são necessariamente ilícitas pelo Direito vigente, mas, ainda assim, acarretam perdas e diminuição da produtividade da empresa. Para fins de exemplo, consideremos que um colaborador da sua empresa também é sócio de uma fornecedora de cadeiras e sua empresa está procurando substituir todas as cadeiras do escritório. Naturalmente, o colaborador pensaria, nesta hipótese, que seria um excelente negócio caso a empresa na qual é sócio possa fornecer as cadeiras. 

Quando este tipo de contratação acontece, geralmente, os preços e condições são negociados com certo favorecimento à empresa fornecedora, já que o colaborador possuirá informações privilegiadas sobre a contratação. Por isso, boa parte das políticas de prevenção ao conflito de interesses preveem que os colaboradores não podem ter participações societárias ou interesses financeiros em organizações que possuam relações comerciais com a sua empresa. 

O conflito de interesses também ocorre quando um colaborador da sua empresa é procurado por um concorrente para prestar um determinado serviço. O colaborador em questão não poderia realizar os serviços ao concorrente, já que possui diversas informações confidenciais e privilegiadas sobre a sua empresa que poderiam ser transmitidas ao concorrente, prejudicando os negócios. Além disso, essa prática é terminantemente antiética e contrária às normas de defesa da concorrência no Brasil.

Relacionamento com Fornecedores e Terceiros

Ainda que a sua empresa demonstre o comprometimento necessário e esteja engajada com as diretrizes estabelecidas, é possível que os seus fornecedores e terceiros pratiquem atos de corrupção sem que você saiba. 

Por isso, um bom Programa de Compliance deve contar com diretrizes e mecanismos para prevenir a contratação de terceiros que não respeitem a legislação vigente. É recomendável que a contratação de terceiros seja realizada mediante um processo de verificação prévia, também conhecido como Background Check ou Due Diligence

Esses mecanismos são necessários para entender mais sobre o seu fornecedor, categorizando-o nos níveis de risco “alto”, “moderado” e “baixo”. Geralmente, são considerados terceiros de alto risco aqueles que possuam contato direto ou indireto com Agentes Públicos, como despachantes, advogados, contadores, entre outros. 

Além da categorização de risco, é importante contar com um checklist de alertas, também conhecido como Red Flags, que pode sinalizar práticas de corrupção pelo terceiro. Esses alertas, incluem, comumente, os seguintes comportamentos: (i) solicitação de pagamento em dinheiro; (ii) tentativa de frustrar o procedimento de verificação prévia; (iii) indicação do terceiro por Agentes Públicos para a execução dos serviços, entre outros. 

Todas estas políticas internas são importantes para que possamos prevenir e remediar atos de corrupção na empresa. Entretanto, para que isso funcione na prática, é necessário que todos sejam conscientizados de seu dever de denunciar qualquer violação ou atitude suspeita.

Por isso, é imprescindível que a sua organização conte com um Canal de Denúncias transparente e imparcial que possa receber e investigar os casos reportados, aplicando as medidas corretivas devidas.  Por fim, relembramos que o êxito de qualquer bom Programa de Compliance depende do monitoramento, treinamento e comunicação constantes com todos aqueles que participam do dia-a-dia de negócios da empresa.

Leia também:

Programa de Compliance: como estruturar e garantir efetividade?

Sumário

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