Responsabilidade Tributária nas Startups

O regime geral da responsabilidade tributária se aplica apenas parcialmente às startups.
Juliano Brito
Juliano Brito
Mestre em Direito pela UNILASALLE Canoas (RS). Especialista em Direito Tributário pelo IBET/INEJE. Especialista em Direito Ambiental pela FEEVALE/RS. Especializando Contabilidade, Gestão Financeira e Fiscal pela PUC/RS. Graduando em Ciências Contábeis pela UNILASALLE Canoas (RS).

Na seara do Direito Tributário vigora, tanto quanto na seara cível-empresarial, o princípio da entidade ou separação patrimonial entre pessoa jurídica e pessoa natural (ou pessoa física, como se costuma dizer na área fiscal). Ou seja, o crédito tributário constituído em favor da Fazenda Pública e contra as empresas-contribuintes como consequência da ocorrência dos fatos geradores de tributos, é devido pela empresa-contribuinte, não pelos seus sócios, administradores, acionistas, síndicos ou investidores.

Responsabilidade Tributária nas Startups

Mas o Direito vive das exceções, e na primeira parte desse artigo  vamos detalhar as situações excepcionais nas quais o clássico Direito Tributário (leia-se, regime juridico do Código Tributário Nacional)  autoriza a responsabilização de terceiros pelos tributos devidos pelas pessoas jurídicas.

Esse regime jurídico geral recebeu aporte especial em meados de 2021, quando foi promulgada a Lei Complementar nº 182/2021, que institui o marco legal das startups e do empreendedorismo inovador, e dispôs sobre a responsabilidade tributária dos investidores em inovação. Na segunda parte desse artigo, analisaremos esse regime jurídico especial.

O objetivo desse artigo é descrever os regimes jurídicos geral e especial de responsabilidade de terceiros por tributos devidos pelas pessoas jurídicas, à luz do Código Tributário Nacional e da Lei Geral das Startups, respectivamente, e tecer considerações analíticas e críticas a respeito do instituto da responsabilidade tributária sob os regimes jurídicos em análise.

Do regime geral de responsabilidade tributária.

Da norma geral de responsabilidade

A Lei nº 5.172/1966, que na ordem constitucional pretérita, instituiu o Sistema Tributário Nacional, passou a ser denominada de Código Tributário Nacional a partir do Ato Complementar nº 36/1967. Um Código é um sistema de normas supostamente coerente cuja normatividade é pretensamente total, ou seja, é um sistema idealmente sem lacunas. Portanto, a pretensão da União Federal foi editar um sistema de leis tributárias válido em todo território nacional que regulasse, da forma mais completa possível, a relação Estado-Contribuinte, sob a ótica de uma Federação.

Esse Código, que hoje chamamos carinhosamente pelas iniciais CTN, embora tenha sido editado como lei ordinária, foi recepcionado pela Constituição Federal de 1.988 como lei complementar, e, portanto, se aplica a todos os Entes da Federação.

Em outras palavras, o CTN é a lei complementar demandada pelo artigo 146 da Constituição Federal de 1.988, à qual cabe (compete)

  • dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;
  • regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;
  • estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:

    a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;
    b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários;
    c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas;
    d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239.

Pois bem, o Título II do CTN trata especificamente de Obrigação Tributária (competência demandada pelo artigo 146, II, “b”, da Constituição, retro), e o CAPÍTULO V desse Título trata de Responsabilidade Tributária, o que pelo critério topológico significa dizer que, para o legislador, a responsabilidade tributária é uma das matérias afetas à obrigação tributária.

Do regime jurídico geral da responsabilidade tributária

O regime jurídico da responsabilidade tributária estatuído pelo CTN parte da disposição geral que a lei pode atribuir a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação (artigo 128).

Na sequência, o legislador do CTN estabeleceu três espécies de responsabilidade tributária: por sucessão do contribuinte original; por extensão do contribuinte original e por infrações

Sucessão

Na espécie sucessão, o CTN estabelece em linhas gerais que

  1. o adquirente de bens ou direitos a eles relativos é responsável pelos tributos propter rem, que são aqueles incidentes sobre a coisa, ainda que devidos do proprietário anterior;
  2. o sucessor a qualquer título e o cônjuge meeiro é responsável pelos tributos devidos pelo de cujus até a data da partilha ou adjudicação;
  3. o espólio, pelos tributos devidos pelo de cujus até a data da abertura da sucessão;
  4. a pessoa jurídica fusionada, transformada ou incorporada pelos tributos devidos até à data do ato pelas pessoas jurídicas a quem sucederam; o adquirente de fundo de comércio ou estabelecimento pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido.

Extensão

Já na espécie de Responsabilidade de Terceiros (extensão) o CTN estabelece duas subespécies: a responsabilidade solidária por subsidiariedade e a responsabilidade pessoal decorrentes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.

A solidária por subsidiariedade está prevista para os casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal do contribuinte original, responsabilizando

  • os pais, pelos tributos devidos por seus filhos menores;
  • os tutores e curadores, pelos tributos devidos por seus tutelados ou curatelados; I
  • os administradores de bens de terceiros, pelos tributos devidos por estes;
  • o inventariante, pelos tributos devidos pelo espólio;
  • o síndico e o comissário, pelos tributos devidos pela massa falida ou pelo concordatário;
  • os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício, pelos tributos devidos sobre os atos praticados por eles, ou perante eles, em razão do seu ofício;
  • os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas.

Já a pessoal por atos praticados atinge

  • todas as pessoas da subespécie anterior, mais  
  • os mandatários, prepostos e empregados; e
  • os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.

Infração

Na última espécie de responsabilidade, por infração, o CTN estabelece que essa independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato, estabelecendo a responsabilidade pessoal do agente:

I – em caso de enquadramento como crimes ou contravenções;

II – em todos os casos em que o agente agir com dolo específico, caso em que são chamados à responsabilidade todos aqueles responsáveis solidariamente por subsidiariedade mais os mandatários, prepostos ou empregados, contra seus mandantes, preponentes ou empregadores, diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.

Essa espécie de responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração apresentada antes do  início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração.

Aplicação do regime geral pelo STJ

O regime jurídico geral da responsabilidade tributária, embora tenha sido arquitetado pelo legislador da década de 1960 para regular o comportamento dos atores econômicos de sua época, vem sendo objeto de constante interpretação e aplicação pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), Corte a qual compete a análise da aplicação da lei federal e, portanto, do CTN.

Diversas questões submetidas a julgamento no STJ pelo regime dos recursos repetitivos (que produzem decisões vinculantes para os demais Tribunais) tratam de temas relativos ao regime geral de responsabilidade tributária, como por exemplo, para citar apenas os mais recentes:

(a) Tema 1158: Definirá se há responsabilidade tributária solidária e legitimidade passiva do credor fiduciário na execução fiscal em que se cobra IPTU de imóvel objeto de contrato de alienação fiduciária;

(b) Tema 1118: firmou a tese que somente mediante lei estadual/distrital específica poderá ser atribuída ao alienante responsabilidade solidária pelo pagamento do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA do veículo alienado;

(c) Tema 1049, que firmou a tese que  a execução fiscal pode ser redirecionada em desfavor da empresa sucessora para cobrança de crédito tributário relativo a fato gerador ocorrido posteriormente à incorporação empresarial e ainda lançado em nome da sucedida, sem a necessidade de modificação da Certidão de Dívida Ativa, quando verificado que esse negócio jurídico não foi informado oportunamente ao fisco;

(d) Tema 981, que firmou o entendimento que o redirecionamento da execução fiscal, quando fundado na dissolução irregular da pessoa jurídica executada ou na presunção de sua ocorrência, pode ser autorizado contra o sócio ou o terceiro não sócio, com poderes de administração na data em que configurada ou presumida a dissolução irregular, ainda que não tenha exercido poderes de gerência quando ocorrido o fato gerador do tributo não adimplido (135, III, do CTN);

(e) Tema 962, que firmou a tese que redirecionamento da execução fiscal, quando fundado na dissolução irregular da pessoa jurídica executada ou na presunção de sua ocorrência, não pode ser autorizado contra o sócio ou o terceiro não sócio que, embora exercesse poderes de gerência ao tempo do fato gerador, sem incorrer em prática de atos com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou aos estatutos, dela regularmente se retirou e não deu causa à sua posterior dissolução irregular (também 135, III, do CTN).

Passemos à segunda parte do artigo, para analisar as novidades “modernizadoras” do regime jurídico das startups, em termos de responsabilidade tributária.

Das disposições especiais sobre Responsabilidade Tributária no novo arcabouço jurídico das startups.

Regras de enquadramento das startups

A Lei Complementar nº 182/2021 institui o marco legal das startups e do empreendedorismo inovador, elevando a densidade normativa do ambiente do empreendedorismo de disrrupção e inovação e ampliando incentivos anteriormente já previstos, desde 2016, na Lei Complementar nº 155/2016, que a seguir será objeto de análise.

Além disso, reforça os contornos jurídicos da posição contratual do chamado investidor-anjo, que é caracterizado pela norma como o investidor que não é considerado sócio nem tem qualquer direito a gerência ou a voto na administração da empresa, não responde por qualquer obrigação da empresa e é remunerado por seus aportes (artigo 2º, inciso I).

A Lei Complementar também dá contorno jurídico à facticidade econômica das startups, que são caracterizadas como as organizações empresariais ou societárias, nascentes ou em operação recente, cuja atuação caracteriza-se pela inovação aplicada a modelo de negócios ou a produtos ou serviços ofertados (art. 4).

Receberão tratamento especial do Estado para fomento as startups que não se constituírem sob a modalidade societária de sociedade anônima (todas as demais modalidades são admitidas), com receita bruta até R$ 16.000.000,00 (dezesseis milhões de reais), com até 10 (dez) anos de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) e  que declarem em seus atos constitutivos  a utilização de modelos de negócios inovadores para a geração de produtos ou serviços. Substitutivamente a essa declaração nos atos constitutivos será admitida a empresa com enquadramento no regime especial Inova Simples da Lei Complementar nº 123/2006.

Portanto, é possível existirem startups sob a forma de sociedade anônima ou com receita superior a R$ 16.000.000,00 (Dezesseis milhões)? A resposta é afirmativa, porém, essas não receberão tratamento incentivado.

Importante destacar que é central ao conceito de startups para fins legais que essas empresas estejam baseadas em inovação. O conceito legal de inovação se remete ao artigo 2º, IV da Lei nº 10.973/2004 (com a redação que lhe deu a Lei nº 13.243/2016), que conceitua inovação como a introdução de novidade ou aperfeiçoamento no ambiente produtivo e social que resulte em novos produtos, serviços ou processos ou que compreenda a agregação de novas funcionalidades ou características a produto, serviço ou processo já existente que possa resultar em melhorias e em efetivo ganho de qualidade ou desempenho.

Capitalização das Startups

A novel legislação regulamenta, também, os instrumento de capitalização das startups favorecendo a participação via equity de investidores pessoa física ou jurídica, sendo que as partes poderão optar por modalidades de investimento que não resultem em titulação de capital social da startup.

As modalidades de investimento “semi-equity” nos quais o aporte não tem a natureza de participação societária  são o

  • I – contrato de opção de subscrição de ações ou de quotas celebrado entre o investidor e a empresa;
  • II – contrato de opção de compra de ações ou de quotas celebrado entre o investidor e os acionistas ou sócios da empresa; a
  • III – debênture conversível emitida pela empresa nos termos da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976; o
  • IV – contrato de mútuo conversível em participação societária celebrado entre o investidor e a empresa; a
  • V – estruturação de sociedade em conta de participação celebrada entre o investidor e a empresa; o
  • VI – contrato de investimento-anjo na forma da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro 2006; e
  • VII – outros instrumentos de aporte de capital em que o investidor, pessoa física ou jurídica, não integre formalmente o quadro de sócios da startup e/ou não tenha subscrito qualquer participação representativa do capital social da empresa.

Realizado o aporte por qualquer dessas modalidades a conversão do instrumento do aporte em efetiva e formal participação societária somente acontecerá se (a) incidir a condição suspensiva prevista contratualmente ou (b) por vontade ulterior das partes.

Portanto, o investidor que realizar o aporte de capital em modalidades “semi-equity” não será considerado sócio ou acionista nem possuirá direito a gerência ou a voto na administração da empresa.

Da responsabilidade tributária do investidor

Por extensão, o investidor “semi-equity” não responderá, conforme expressa dicção do artigo 8º, II da Lei Complementar nº 182/2021 por qualquer dívida da empresa, inclusive em recuperação judicial, e a ele não se estenderão o disposto nos artigos 124, 134 e 135 do CTN, salvo dolo, fraude ou de simulação com o envolvimento do investidor.

Disposições fiscais benéficas ao investidor em startups, assim como restritivas da responsabilidade dos investidores, já existiam no ambiente jurídico brasileiro desde a edição da Lei Complementar nº 155/2016, que alterou a Lei do SIMPLES NACIONAL (Lei Complementar nº 123/2006) para incentivar as atividades de inovação e os investimentos produtivos em micro e pequenas empresas admitindo o aporte de capital do tipo “semi-equity” através de contratos de participação, com vigência não superior a sete anos através de investidor-anjo.  Já previa a Lei Complementar nº 155/2016 que o investidor-anjo não será considerado sócio nem terá qualquer direito a gerência ou voto na administração da empresa. A Lei Complementar nº 182/2021 veio a ressalvar a possibilidade, entretanto, da possibilidade de participação do investidor-anjo nas deliberações em caráter estritamente consultivo, conforme pactuação contratual.

A Lei Complementar nº 155/2016, entretanto, não dispora sobre a responsabilidade tributária do investidor-anjo, prevendo à época, apenas genericamente que não responderia por nenhuma dívida da empresa nem estaria sujeito à responsabilidade patrimonial por despersonalização nos termos do artigo 50 do CCb.

Interações entre o CTN e o regime especial de responsabilidade dos investidores em startups

A primeira observação que se deve fazer é que a Lei das Startups não se limitou a editar normas especiais sobre responsabilidade tributária por sucessão, extensão ou infração, mas avançou à seara da própria sujeição passiva da obrigação tributária, ao incluir na cláusula de exoneração de responsabilidade do investidor o artigo 124 do CTN, que prevê a solidariedade do sujeito passivo e responsável que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal.

Esse tópico tem implicações dogmáticas e teóricas diversas da responsabilidade por sucessão, extensão e infração que investigamos acima, vez que a responsabilidade do artigo 124 ocorre no momento do surgimento da obrigação tributária, enquanto a responsabilidade dos artigos 134 e 135 do CTN surge em momento posterior à obrigação e, no mais das vezes,  após a constituição do crédito tributário.

O que se ressalta, nesse caso, é a preocupação do legislador da Lei das Startups em ampliar ao máximo a cláusula de exoneração de responsabilidade dos investidores.

No que tange à referência aos artigos 134 e 135 do CTN, é de se notar que em geral  a pretensão do legislador deve ser prevenir a interpretação extensiva da responsabilidade por extensão, uma vez que essas subespécies já não previam, originalmente, a responsabilização do sócio de capital sem poderes de administração, ou do investidor a qualquer título, na espécie de responsabilidade por extensão e suas subespécies de responsabilidade solidária por subsidiariedade e responsabilidade pessoal decorrentes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.

A impressão que se tem é que ao afastar a aplicação dos artigos 134 e 135 o legislador mirou na jurisprudência dos Tribunais e na prática jurisdicional que perdulariamente redireciona cobranças a sócios que nunca exerceram poderes de administração ou gerência, a exemplo do que recentemente veio a definir, por maioria, a 1ª Seção do  STJ no sentido que o  sócio  com poderes de administração no momento do fechamento irregular de uma empresa deve responder pelos débitos fiscais, mesmo que não tenha exercido a gerência no momento do fato gerador do tributo não pago (REsps 1643944/SP, 1645281/SP e 1645333/SP).

Por outro lado, a Lei das Startups não previu o afastamento do investidor “semi-equity” do cálice da responsabilidade por sucessão dos artigos 129 a 133 do CTN, da espécie sucessão, em especial no caso da responsabilidade da pessoa jurídica fusionada, transformada ou incorporada pelos tributos devidos até à data do ato pelas pessoas jurídicas a quem sucederam e do adquirente de fundo de comércio ou estabelecimento pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido.

Tais previsões seriam importantes para evitar a tentativa de responsabilização do investidor que, após converter seu aporte de capital em participação societária, tenha que conviver com passivos tributários gerados anteriormente ao seu ingresso definitivo na sociedade.

Dos casos de dolo, fraude e simulação

A cláusula de exoneração de responsabilidade dos investidores em startups não terá efeito, respondendo o investidor pelos tributos devidos pela pessoa jurídica, nos casos de dolo, fraude ou de simulação com o envolvimento do investidor.

A fraude, nos termos do artigo 72 da Lei nº 4.502/1964 é toda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar, total ou parcialmente, a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, ou a excluir ou modificar as suas características essenciais, de modo a reduzir o montante do imposto devido a evitar ou diferir o seu pagamento. Nesse caso o investidor praticaria atos utilizando-se de meios fraudulentos (falseamento, adulterações, declarações falsas) para a ocultar sua posição de equity no empreendimento.

Já a simulação, segundo Luciano Amaro, seria reconhecida pela falta de correspondência entre o negócio que as partes realmente estão praticando e aquele que elas formalizam. (AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro 23 ª edição São Paulo Saraiva Educação, 2019). Um exemplo de simulação ser o investidor atuar no dia a dia da startup como sócio, mas formalizar seu aporte de capital pela modalidade “semi-equity” para evitar a responsabilização. Outro exemplo seria o do empreendedor que constitui a empresa por interposta pessoa e figura documentalmente como investidor, quando na verdade exerce a administração. 

Já o dolo é um elemento de vontade que caracteriza a vontade de prejudicar o Erário público evadindo-se do pagamento de tributos, sendo elemento comum à fraude e à simulação, que não dispensam a ação dolosa do agente.

É de se registrar que o descumprimento das normas fiscais condicionantes da condição de investidor pode acionar a responsabilização do investidor. Nesse sentido, observar que a remuneração de seus aportes pelo prazo máximo de 7 (sete) anos; observar o prazo mínimo para exercer direito de resgate; exercer o direito de exigir dos administradores as contas justificadas de sua administração e, anualmente, o inventário, o balanço patrimonial e o balanço de resultado econômico e de examinar, a qualquer momento, os livros, os documentos e o estado do caixa e da carteira da sociedade, nos termos das alterações  que a Lei das Startups fez na Lei do SIMPLES Nacional, é essencial para que o investidor não perca sua “imunidade”.

Também é passível de enquadramento como dolo ou simulação aqueles casos em que a empresa declarar um caráter inovatório e disruptivo que não possui, para se beneficiar clausula de um regime jurídico mais vantajosa a que estão submetidos as empresas profissionais.

Leia também: A advocacia Consultiva especializada em Empresas de Tecnologia e Startups

Conclusões

O regime jurídico geral da responsabilidade tributária estatuído pelo CTN três espécies de responsabilidade tributária de terceiros: por sucessão do contribuinte original; por extensão do contribuinte original e por infrações. 

A Lei Complementar nº 182/2021 (Lei das Startups) estabeleceu um regime juridico especial de responsabilidade tributária ao investidor “semi-equity”, que não responderá, conforme expressa dicção do artigo 8º, II da Lei Complementar nº 182/2021 por qualquer dívida da empresa, inclusive em recuperação judicial, e a ele não se estenderão o disposto nos artigos 124, 134 e 135 do CTN, salvo dolo, fraude ou de simulação com o envolvimento do investidor.

A Lei das Startups, entretanto, não previu ao investidor o afastamento da responsabilidade por sucessão dos artigos 129 a 133 do CTN, da espécie sucessão, em especial no caso da responsabilidade da pessoa jurídica fusionada, transformada ou incorporada pelos tributos devidos até à data do ato pelas pessoas jurídicas a quem sucederam e do adquirente de fundo de comércio ou estabelecimento pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido.

A omissão da Lei das Startups pode gerar tentativas de responsabilização do investidor que, após converter seu aporte de capital em participação societária, tenha que conviver com passivos tributários gerados anteriormente ao seu ingresso definitivo na sociedade.

A referencia da Lei das Startups ao afastamento da responsabilidade por sujeição passiva do artigo 124 do CTN vai além da especialização do regime geral de responsabilidade tributária de terceiros do CTN, ao modificar regras de sujeição passiva tributária, e tal dispositivo poderá ser objeto de contestação jurídica e controvérsias administrativas e judiciais.

É necessário um acompanhamento jurídico, fiscal e contábil estrito (compliance) das regras de incentivo econômico e fiscal das startups, para evitar que as modalidades de investimento se “semi-equiity” (aporte e remuneração de capital sem caracterização de capital de terceiros e sem constituição de participação societária) para evitar a descaracterização dos instrumentos contratuais por dolo, fraude ou simulação, e a responsabilização do investidor por dívidas tributárias da startup.  

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